Sabe-se lá Deus o porquê. Mas eu ligo Quaresma às Minas Gerais. Não insista em tentar saber por que. Talvez por causa da Páscoa, já que há toda uma espiritualidade no ar, ligando com o fato de Minas Gerais ser o solo de várias Igrejinhas forradas de ouro, o que conseguiu ficar por aqui. Não sei. E ao falarmos de Minas Gerais, lembramos imediatamente do Clube da Esquina, um movimento musical que surgiu na segunda metade dos anos 60, em pleno Tropicalismo, Ditadura e Generais. A música que deu o estopim para o movimento foi a de Milton Nascimento e Fernando Brant, em 1967. Mais tarde, ela foi gravada em inglês também, nas vozes de Bituca - apelido carinhoso de Milton Nascimento, dado por amigos - e Sarah Vaughan. | TRAVESSIA Quando você foi embora fez-se noite em meu viver Forte eu sou mas não tem jeito, hoje eu tenho que chorar Minha casa não é minha, e nem é meu este lugar Estou só e não resisto, muito tenho prá falar Solto a voz nas estradas, já não quero parar Meu caminho é de pedras, como posso sonhar Sonho feito de brisa, vento vem terminar Vou fechar o meu pranto, vou querer me matar Vou seguindo pela vida me esquecendo de você Eu não quero mais a morte, tenho muito que viver Vou querer amar de novo e se não der não vou sofrer Já não sonho, hoje faço com meu braço o meu viver Solto a voz nas estradas, já não quero parar Meu caminho é de pedras, como posso sonhar Sonho feito de brisa, vento vem terminar Vou fechar o meu pranto, vou querer me matar |
Uma das verdades contadas no livro "Os sonhos não envelhecem - Histórias do Clube da Esquina", do igualmente mineiro Marcio Borges, é que o clube surgiu no quarto dos homens, no apartamento dos irmãos Borges, centro de Belo Horizonte. Tudo bem que o edifício Levy ficava, justamente, numa esquina. Mas não foi por causa dessa esquina que o Clube ganhou tal fama.
Até meados da década de 1970, e seguindo a tendência de Milton Nascimento, outros artistas puseram o pé na estrada para defender o movimento, que ganhara força, apesar da segunda posição de Travessia no Festival Internacional da Canção, promovido pela TV Globo ainda em 1967. No Brasil, vice-campeão de qualquer coisa cai no esquecimento. Mas com Bituca foi diferente, e levou consigo uma legião de músicos que tocavam seus violões e cantavem mineiramente poesias de amor, denunciavam ideais sociais mancos,...
Beto Guedes. Fonte: http://www.beto-guedes.blogspot.com/ |
Entre esses artistas está Aberto de Castro Guedes. O rapaz, tímido - ainda assim até hoje - fez uma participação especial no LP Clube da Esquina, de 1971; lançou um álbum com Danilo Caymmi, Novelli e Toninho Horta. Até então, a música desses mineiros era quase uma música caipira: violão, violão e violão.
Mas o divisor de águas do Clube da Esquina, a meu ver, foi quando surgiu o primeiro disco solo de Beto Guedes, "A Página do Relâmpago Elétrico", em 1977, com fortes influências do quarteto The Beatles, relançado em 1986. Arrisco-me a dizer que o Clube da Esquina se divide em a.B. e d.B., ou seja, antes e depois de Beto Guedes.
LUMIAR Anda, vem jantar, Vem comer, vem beber, farrear Até chegar Lumiar E depois deitar no sereno Só pra poder dormir e sonhar Pra passar a noite Caçando sapo, contando caso De como deve ser Lumiar Acordar, Lumiar, sem chorar, Sem falar, sem quer Acordar em lumiar Levantar e fazer café Só pra sair caçar e pescar E passar o dia Moendo cana, caçando lua Clarear de vez Lumiar Amor, Lumiar, Pra viver, pra gostar, Pra chover, pra tratar de vadiar Descansar os olhos, olhar e ver e respirar Só pra não ver o tempo passar Pra passar o tempo Até chover, até lembrar De como deve ser Lumiar Anda, vem cantar, Vem dormir, vem sonhar, pra viver Até chegar em Lumiar Estender o sol na varanda até queimar Só pra não ter mais nada a perder Pra perder o medo, mudar de céu, mudar de ar Clarear de vez Lumiar | Sua discografia não é tão extensa quanto ao Milton Nascimento. Mas Beto Guedes e sua guitarra elétrica deu um outro rumo ao Clube da Esquina, mostrando que, além de ser capaz de fugir do violão, as músicas poderiam ter outros arranjos e outros instrumentos, como os casos de Wagner Tiso, parceiro de Milton no estúdio em "Coração de Estudante", e de Flavio Venturini, inicialmente com o grupo 14 Bis e, depois, em carreira solo. Ambos pianistas. Fonte: http://amusicaquevemdeminas.blogspot.com/ Um dos grandes mistérios da história fonográfica nacional é essa capa aí, do LP "Clube da Esquina", lançado em 1972: quem são essas crianças? Há quem jure pelo ouro de Minas que são Milton Nascimento e...? Seria, mesmo, Milton? |
Há na cultura atual, como um todo, uma grande onda revival. Velhos costumes, cores e roupas estão voltando. Com a música não é diferente. Apesar de vários artistas regravarem músicas do Clube da Esquina, mesmo na época, como o caso de Elis Regina, fica aqui a esperança de vermos - e ouvirmos - os integrantes originais desse movimento musical nacional.
O primeiro a retornar do hiato foi, justamente, Beto Guedes, lançando o CD "Dias de Paz" em 1998, sete anos após "Andaluz". Milton Nascimento praticamente não parou a sua produção. O maior intervalo entre discos é de 2 anos, mas ficou afastado da mídia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário